APRESENTAÇÃO
Em 1971, poucos dias antes de morrer, nas primeiras linhas de uma palestra apenas rascunhada, Winnicott dirigiu o seguinte pedido à comunidade psicanalítica: “Estou pleiteando por uma espécie de revolução em nosso trabalho. Vamos reexaminar o que estamos fazendo”. Esse pedido não foi ouvido na época – só foi publicado em 2013.
Antes dessa data, era raro alguém falar no caráter revolucionário da modificação da clínica psicanalítica e das terapias em outras áreas de saúde introduzida por Winnicott nos seus escritos. Não haveria, muitos pensavam, nem uma patologia nem uma clínica winnicottiana (para Pontalis, não existe a “grade teórica” winnicottiana nem o “paciente winnicottiano”). As mais notáveis exceções são os textos de M. Masud Khan (1971), que fala em “revolutionary shift” no pensamento e na prática analítica, e, sobretudo, Jay R. Greenberg e Stephen A. Mitchell (1983), que usaram, ainda que apenas parcialmente, a teoria das revoluções científicas de Kuhn para explicar a novidade e analisar alguns dos elementos do paradigma winnicottiano (da sua “matriz disciplinar”) para a psicanálise. A partir de 1996, Z. Loparic começou a aplicar, de forma sistemática, todos os elementos da estrutura das revoluções científicas explicitados por Kuhn para estabelecer a tese da revolução winnicottiana do tipo kuhniano na psicanálise. A partir de 1998, Elsa Dias, seguida por alunos e colaboradores de Loparic, dedicou-se a detalhar tópicos centrais da matriz disciplinar de Winnicott, a saber, saúde maturacional (processo de amadurecimento saudável), doença maturacional (distorções do amadurecimento, com as psicoses ocupando o lugar de exemplares paradigmáticos do adoecer) e terapia maturacional (holding, regressão no setting e uso terapêutico da falha do terapeuta, entre outros). A ideia de paradigma winnicottiano foi recebida com interesse no âmbito internacional (Abram, Esher, Minhot, Dethiville) e, desde 2004, é matéria de ensino na Escola de Psicanálise Winnicottiana hoje assumida pelo Instituto Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana (IBPW).
O tema da revolução winnicottiana foi relançado em 2013 internacionalmente com a publicação por Jan Abram, pela Routledge, da coletânea Donald Winnicott Today, que traz, na folha de rosto, em letra manuscrita, o acima citado pedido de Winnicott por uma revolução, e inclui, além de artigos do próprio Winnicott, Ogden, Green, Roussillon, um texto de Loparic.
Em 2023, dez anos depois, é comum ouvir-se falar em Winnicott revolucionário. No plano internacional, às afirmações enfáticas de Eshel, Abram e Minhot sobre o novo paradigma, juntaram-se Roussillon e Ogden, além de membros dos Grupos Winnicott de Lisboa, Córdoba, Roma e Liège, e do Beijing Mental Health Facilitating Center. No Brasil, enquanto a Escola da São Paulo continua trabalhando e publicando sobre o tema, vários outros estudiosos, se não abraçam a tese da revolução winnicottiana, não hesitam em atribuir a Winnicott concepções que desafiam e, ao mesmo tempo, estimulam os psicanalistas, os terapeutas de outras áreas da saúde e não poucos entre aqueles que participam de atividades culturais em geral.
Esperamos que o XXVII Colóquio do IBPW, dedicado ao debate internacional sobre as interpretações da revolução winnicottiana, possa lançar nova luz sobre o sentido do legado clínico e teórico de Winnicott e abrir perspectivas para a apropriação clínica da obra do pai do paradigma maturacional para a pesquisa e o tratamento dos problemas do existir humano.
Z. Loparic
PROGRAMAÇÃO
Quinta-feira, 04 de maio de 2023
17h45| Abertura: Profa. Dra. Claudia Dias Rosa (IBPW/IWA) e Prof. Dr. Zeljko Loparic (IBPW/IWA)
18h00| Supervisão Pública
Supervisora: Profa. Dra. Elsa Oliveira Dias (IBPW/IWA)
Supervisionada: Adriana Maria Pacchioni de Deus (IBPW)
Título: Quando a rigidez esmorece: um relato sobre a regressão terapêutica de Verônica.
Moderadora: Profa. Dra. Claudia Dias Rosa (IBPW/IWA)
19h30| Encerramento
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Sexta-feira, 05 de maio de 2023
14h50| Abertura: Profa. Dra. Claudia Dias Rosa (IBPW/IWA)
15h00| Conferência: Prof. Dr. Zeljko Loparic (IBPW/IWA)
Título: A estrutura da Revolução Winnicottiana.
Moderadora: Profa. Dra. Conceição Aparecida Serralha (IBPW/IWA)
16h10| Mesa Redonda
Palestrante I: Profa. Dra. Leticia Olga Minhot (Universidad Nacional de Cordoba/Argentina)
Título: Los cambios en los valores.
16h30| Palestrante II: Profa. Dra. Roseana Moraes Garcia (IBPW/IWA)
Título: Loparic, Abram e a mudança paradigmática.
Moderadora: Raquel Fernandes Silva (IBPW)
17h20| Mesa Redonda
Palestrante I: Prof. Dr. Décio Gurfinkel (USP/SP)
Título: Winnicott e as Relações de Objeto: busca de objeto, busca do Self
17h40| Palestrante II: Profa. Dra. Elsa Oliveira Dias (IBPW/IWA)
Título: Aspectos da mudança paradigmática de Winnicott
Moderador: Daniela Guizzo (IBPW/IWA)
18h20| Encerramento
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Sábado, 06 de maio de 2023
08h50 | Abertura: Profa. Dra. Claudia Dias Rosa (IBPW/IWA)
09h00 | Mesa Redonda
Palestrante I: Rodolfo José Fenille Ferraz (IBPW/IWA)
Título: Pensando a Revolução Winnicottiana como auxílio para uma psicologia contextual.
09h20| Palestrante II: Prof. Dr. Loris Notturni (Université de Liège/IWA/ Bélgica)
Título: Quando dois psicanalistas olham para um berço, mas não veem a mesma realidade: da Hilflosigkeit à dependência absoluta.
Moderador: Paul Gayet (IBPW)
10h10| Mesa Redonda
Palestrante I: Prof. Dr. Tales Afonso Muxfeldt Ab´Sáber (UNIFESP/SP)
Título: Porque falamos com um outro? Afeto do encontro e existência em Winnicott.
10h30| Palestrante II: Prof. Dr. André Martins (UFRJ/RJ)
Título: Uma tópica winnicottiana.
Moderador: Profa. Ilana Delgado Rabeh (IBPW/IWA)
11h20| Mesa Redonda
Palestrante I: Profa. Dra. Julieta Maria Bareiro (Conceit-UBA-UBACyt/Argentina)
Título: La existencia creativa: una lectura del paradigma winnicottiano en tiempos de adversidad.
11h40| Palestrante II: Profa. Dra. Danit Zeava Falbel Pondé (IBPW/IWA)
Título: O medo de morrer: um novo olhar.
Moderador: Mariela Nobel (IBPW)
12h30| Mesa Redonda
Palestrante I: Prof. Eder Soares Santos (Universidade Estadual de Londrina/PR)
Título: Revolução winnicottiana frente a algumas reflexões contemporâneas que corroboram sua mudança de paradigma.
12h50| Palestrante II: Profa. Dra. Caroline Vasconcelos Ribeiro (UESB/IBPW/IWA)
Título: A revolução winnicottiana e as Memórias de Schreber: em busca de um olhar “além” de Freud.
Moderador: Profa. Dra. Claudia Dias Rosa (IBPW/IWA)
13h30| Encerramento
Resumos
Prof. Dr. Zeljko Loparic (IBPW/IWA)
Mini currículo: Graduado, mestre e doutor em Filosofia (Universidade Católica de Louvain, 1962; 1965; 1982) e pós-doutorado em Filosofia (Universidade de Konstanz, 1987). Atualmente, é professor titular colaborador da Universidade Estadual de Campinas e docente da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Tem experiência de ensino e pesquisa na área de filosofia, com ênfase em história da filosofia e filosofia da psicanálise, desenvolvendo trabalhos principalmente sobre seguintes autores e temas: Kant, Heidegger, Winnicott, semântica transcendental, pensamento pós-metafísico e paradigma winnicottiano.
Título: A estrutura da revolução winnicottiana
Resumo: Depois de esboçar uma análise do pedido de Winnicott por uma revolução em clínica psicanalítica, feito por ele em 1971, poucos dias antes da sua morte, considerando para tanto o caráter revolucionário da sua obra (item 1), o presente trabalho percorrerá as principais etapas do desenvolvimento e de institucionalização da interpretação proposta por Dias e eu mesmo dessa revolução (itens 2-5), para, em seguida, tratar de outras interpretações (itens 6 e 7), terminando por considerações programáticas a respeito do possível avanço das pesquisas sobre o legado revolucionário de Winnicott (item 8).
Profa. Dra. Elsa Oliveira Dias (IBPW/IWA)
Mini currículo: Elsa Oliveira Dias é psicóloga clínica e analista didata (IBPW). É mestre em Filosofia e doutora em Psicologia Clínica pela PUCSP, com a tese “A teoria das psicoses de D. W. Winnicott”. Em 2001, fundou, juntamente com Zeljko Loparic, o Centro Winnicott de São Paulo (CWSP); em 2005, ambos fundaram a Sociedade Brasileira de Psicanálise Winnicottiana (SBPW), que tem como objetivo promover pesquisa, ensino e divulgação da psicanálise winnicottiana. Em 2013, foi cofundadora com Z. Loparic, e vice-presidente da IWA (International Winnicott Association). É autora dos livros A teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott, já em sua 4ª edição (2017); sobre a confiabilidade e outros estudos (2011), Interpretação e manejo na clínica winnicottiana (2014), e Competências do terapeuta winnicottiano (2021), todos pela DWWeditorial, além de vários artigos sobre Winnicott, a filosofia e a psicanálise, publicados no Brasil e no exterior.
Título: Aspectos da mudança paradigmática de Winnicott
Resumo: Além de pôr em pauta a discussão sobre o caráter da originalidade da obra winnicottiana, que, na escola de São Paulo vem sendo examinada em termos de revolução paradigmática de tipo kuhniano, o estudo reúne, de maneira condensada, alguns dos aspectos da teoria winnicottiana que justificam essa nomeação.
Profa. Dra. Leticia Olga Minhot (Argentina) espanhol
Mini currículo: La Doctora Leticia Olga Minhot se graduó como Licenciada en Filosofía por la Facultad de Filosofía y Humanidades de la Universidad Nacional de Córdoba y como Doctora en Filosofía en la Universidade Estadual de Campinas bajo la dirección del Dr. Zeljko Loparic. En la actualidad es Profesora Titular por concurso en la cátedra Concepciones Filosóficas en la Facultad de Ciencias Sociales y en la cátedra Problemas Epistemológicos de la Psicología en la Facultad de Psicología. Ambas en la Universidad Nacional de Córdoba. Es también directora de la editorial Ciencia con todes de la Facultad de Psicología (UNC). Sus áreas de investigación, en la actualidad, son ética del cuidado y filosofía política de la ciencia.
Título: Los cambios en los valores
Resumo: En este trabajo nos proponemos revisar el alcance de la revolución winnicottiana respecto a los valores epistémicos y éticos. Los valores constituyen un elemento muy importante de las matrices disciplinares, ya que son elementos constitutivos del conocimiento que esa matriz hace posible. En esta oportunidad nos centraremos en los valores epistemológicos y en los éticos. Analizaremos los que se encuentran en la matriz winnicottiana en comparación con los presentes en la matriz freudiana.
(EN) In this paper we intend to review the scope of the Winnicottian revolution regarding epistemic and ethical values. The values constitute a very important element of the disciplinary matrices since they are constitutive elements of the knowledge that this matrix makes possible. This time we will focus on epistemological and ethical values. We will analyze those found in the Winnicottian matrix in comparison with those present in the Freudian matrix.
(PT) Neste artigo pretendemos revisar o alcance da revolução winnicottiana no que diz respeito aos valores epistêmicos e éticos. Os valores constituem um elemento muito importante das matrizes disciplinares uma vez que são elementos constitutivos do conhecimento que esta matriz possibilita. Desta vez vamos nos concentrar em valores epistemológicos e éticos. Analisaremos os encontrados na matriz winnicottiana em comparação com os presentes na matriz freudiana.
Profa. Dra. Roseana Moraes Garcia (IBPW/IWA)
Mini currículo: Analista Didata (IBPW). Presidente da International Winnicott Association (IWA/2022-2023). Mestre em Psicologia Clínica pela PUC-SP com a dissertação “A Tendência Antissocial em D.W. Winnicott” (2004). Doutora em Psicologia Clínica pela PUC-SP com a tese “A Agressividade na Psicanálise Winnicottiana” (2009). Especialista em Saúde Mental Infantil pela FCM/Unicamp (1994). Assessora acadêmica do IBPW. Professora e supervisora do IBPW. Artigos publicados: “O uso da consulta terapêutica na clínica da tendência antissocial” (2005), “O tratamento de crianças afastadas do convívio familiar” (2009), “Entrevista com Loparic” (2012), “A ética do cuidado e a sociedade democrática” (2013), Tendência antissocial em Winnicott: teoria e clínica (2014).
Título: Loparic, Abram e a mudança paradigmática.
Resumo: Desde 1998, com a vinda de Jan Abram para o Brasil, por ocasião do III Colóquio Winnicott de São Paulo, Loparic introduziu, no seu debate teórico com ela, sua tese de que Winnicott havia operado uma revolução paradigmática na psicanálise nos moldes kuhnianos. Esse fato teve vários desdobramentos na relação teórica entre os dois, os quais pretendo apresentar neste trabalho.
Prof. Dr. Décio Gurfinkel (USP/SP)
Mini currículo: Graduado em Psicologia pela Universidade de São Paulo (1985) e mestrado em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (1992). Tem experiência na área de Psicologia. Atuando principalmente nos seguintes temas: sonho, sono, gesto, criatividade, intermediário e psicanálise.
Título: Winnicott e as Relações de Objeto: busca de objeto, busca do Self
Resumo: Sugiro considerarmos a contribuição de Winnicott, em que pese a sua singularidade e imensa genialidade, como inserida em uma importante corrente de pensamento na história das ideias em psicanálise: as ditas Relações de Objeto. As sementes de tal corrente se encontram nas obras de Freud, Abraham e Ferenczi, e seu florescimento mais significativo se deu no ambiente da psicanálise inglesa, com destaque para Fairbairn, Balint e Winnicott. Neste complexo percurso de construção do pensamento, creio que podemos reconhecer uma dialética entre continuidade e transformação. A proposição de Fairbairn da “busca objeto” orientando a vida psíquica, retrabalhada em uma perspectiva histórico-crítica renovada, pode ser tomada como um princípio organizador desta corrente de pensamento. De tal busca decorre o lançar-se no espaço intersubjetivo como próprio do humano, assim como a construção de um espaço psíquico pessoal e de um espaço de sonho; mas, com Winnicott, compreendemos que tal mote deve ser complementado, dialeticamente, com o seu contraponto: “a busca do Self”: é no interjogo entre o “estar com” e o “estar só” que se dá a vida psíquica humana.
Rodolfo José Fenille Ferraz (IBPW/IWA)
Mini currículo: Psicanalista. Possui formação em filosofia, teologia e psicologia.
Título: Pensando a Revolução Winnicottiana como auxílio para uma psicologia contextual
Resumo: Pretende-se pensar de que maneira a resolução paradigmática no interior da psicanálise, proporcionada pela teoria de Winnicott, pode oferecer respostas às indagações (legítimas) feitas por psicologias contextuais, em chave decolonial.
Loris Notturni (Université de Liège/IWA)
Mini currículo: 2005 : Graduação em Filosófia e Letras (specialidades : epistemológia e teoria da linguagem) pela Universidade de Liège, Belgica 2007 : Mestrado em Filosófia (sobre a questão da illusão na filosofia critica) 2008 : Agregação em Filosófia 2010 – : Assistente do departamento de Antropologia filosófica e filosofia das ciências humanas (Université de Liège) 2011-2012 : Viagem de specialização em psicanalise winnicottiana em São Paulo (SBPW) 2012 : Fundador do Groupe d’Etudes Winnicottiennes (Université de Liège) 2013 – 2016 : Secretario geral da IWA 2017 : Dotourado em Filosofia (Université de Liège) sobre Kant e Winnicott 2017 : Lecturer in Sino-Brazilian International Winnicottian Training Program (Basics), Huilongguan Hospital, Beijing.
Título: Quando dois psicanalistas olham para um berço, mas não vêem a mesma realidade: da Hilflosigkeit à dependência absoluta
Resumo: O objetivo dessa palestra é salientar, através de um fenômeno clínico bem conhecido, as diferenças entre a teoria clínica de Freud e a teoria do amadurecimento de Winnicott. Por meio de um exemplo didático, mostrarei como essas duas abordagens clínicas realmente constituem duas estruturas eletivas de fenômenos fundamentalmente diferentes. Vou propor um esquema útil que permitirá aos clínicos comparar sistematicamente essas duas formas de considerar o mesmo fenômeno e não ver a mesma coisa nele.
Prof. Dr. Tales Afonso Muxfeldt Ab´Sáber (UNIFESP)
Mini currículo: Psicanalista e ensaísta, professor de filosofia da psicanálise na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), coordenador da Clínica Aberta de Psicanálise na Casa do Povo, autor de, entre outros, O sonhar restaurado, formas do sonhar em Winnicott, Bion e Freud (Editora 34), Winnicott, paradoxo e experiência (Ubu) e O soldado antropofágico, escravidão e não-pensamento no Brasil (n-1).
Título: Porque falamos um com o outro? Afeto do encontro e existência em Winnicott
Resumo: Na dúvida essencial de uma comunicação que desvia de seu objeto e de sua problemática central, Freud observou uma dissociação no plano dos afetos. Em sua originalo afeto pode não corresponder à verdade do que o envolve e determina. Situações humanas neutras em um sonho, ao serem desdobradas em suas múltiplas articulações de sentido podem apresentar situações afetivas de grande intensidade, inexistentes no corpo do próprio sonho. Ao fazer seu trabalho de disfarce do que importa, o sonho operária suprimindo ou mesmo invertendo afetos, como suprime ou inverte sentidos. Há uma surpreendente desconexão entre afeto e sentido, e a forma sintoma, na sua fratura dialética suspensa, modula e controla o afeto. Em Winnicott há uma fundamental experiência do encontro no afeto, de modo que diferenças humanas de desenvolvimento e maturação possam experienciar algo comum. O afeto, sutil e mútuo, pode ser fundamento e base de comunicação, realizador, campo de uma experiencia significativa, unidade poética de alguém em reconhecimento e, a partir de tal experiencia, campo emergente da transformação de algo próprio. O fato clínico das “crianças se esclarecerem a si mesmas” na sua presença, revela essa congruência afetiva, realizada no encontro, como potencial comunicativo e mutativo que se desdobra como criação.
Prof. Dr. André Martins (UFRJ)
Mini currículo: Filósofo e psicanalista, professor do Núcleo de Bioética e Ética Aplicada da UFRJ (NUBEA), membro do Programa de Pós-Graduação em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva (PPGBIOS) da UFRJ/FIOCRUZ/UFF/UERJ, e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia (PPGF) da UFRJ. Doutor em Filosofia pela Université de Nice, França, Doutor em Teoria Psicanalítica pela UFRJ, com Pós-Doutorado Sênior em Filosofia pela Université de Provence, França, foi professor visitante das universidades de Amiens e de Reims, na França, pesquisador convidado da Université de Paris I Sorbonne. Organizou os livros “Spinoza et la psychanalyse” (Ed.Hermann, 2012), “O mais potente dos afetos: Spinoza e Nietzsche” (Martins Fontes, 2008), “As ilusões do eu: Spinoza e Nietzsche” (Civilização Brasileira, 2012); é autor do livro “Pulsão de morte? Por uma clínica psicanalítica da potência” (EdUFRJ, 2009) e de uma centena de artigos acadêmicos publicados em 5 línguas no Brasil, Portugal, França, Alemanha, Bélgica, Hungria e Estados Unidos. Coordena o projeto digital @andremartinsfilosofia, pelo qual oferece cursos como “Spinoza para a Clínica” e “O mais potente dos afetos”; e divulga seu trabalho autoral no canal do YouTube “André Martins Filosofia”.
Título: Uma tópica winnicottiana
Resumo: A primeira e a segunda tópicas de Freud, assim como os registros do psiquismo segundo Lacan, que poderíamos considerar como a tópica lacaniana, descrevem o funcionamento da psique humana a partir de uma base filosófica (ontológica) dicotômica, que crê enxergar uma instância pulsional propriamente natural que deve ser contida ou organizada por uma outra instância, oposta à primeira, cultural, ou mesmo civilizatória: fundamento metafísico segundo o qual o corpo se opõe à mente, e esta deve conter os excessos bestiais daquele (ou pecados, na versão religiosa). Assim, o inconsciente deve se tornar consciente, o id deve ser contido ou reprimido pelo superego, o simbólico deve funcionar como uma linguagem e impor uma Lei de modo a organizar o imaginário e conter o real destrutivo. Em suma, haveria uma pulsão de morte originária e a necessidade de opor-se a ela, para que a vida se torne viável, ainda que sob o preço incontornável da neurose obsessiva como formação básica defensiva do psiquismo. Contrariamente às tópicas freudianas e lacaniana, Winnicott descreve o psiquismo sob outra base, uma base imanentista, configurando o que podemos chamar de uma tópica winnicottiana, na qual somos um psiquessoma, cuja força vital não precisa ser reprimida, mas ao contrário, a repressão a ela é que está na etiologia dos transtornos psíquicos, enquanto sua expressão é a base da própria saúde psíquica e mental. Toda repressão à força vital se dá pela formação de defesas psíquicas, por introjeção superegoica, através da crença, em geral inconsciente, porém reforçada pela cultura e pelo senso comum (inclusive filosófico e psicanalítico), de que a mente deve e pode controlar os afetos. O que ocorre, no entanto, é apenas uma dissociação funcional imaginária entre a mente e o psiquessoma, o ego passando a se identificar com a mente e estranhar o psiquessoma, que é a própria pessoa e seu self, como sendo um outro pulsional, inconsciente, corporal, origem do risco e da pulsão de morte. A tópica winnicottiana, como veremos, se apresenta de maneira particularmente clara no texto “A mente e sua relação com o psiquessoma”.
Profa. Dra. Julieta Maria Bareiro (Conicet-UBA-UBACyT)
Mini currículo: Dra. en Psicología (UBA), Magistra en Psicoanálisis (UBA), Investigadora CONICET, Profesora a cargo de “Psicología, Ética y DDHH” Cat. II (Facultad de Psicología-UBA), autora de El analista como objeto de uso en la obra de D.W. Winnicott (Letra Viva, 2012) y Winnicott y Heidegger, hacia una metapsicología de la transicionalidad (Biblos, 2020), así como diversos artículos sobre la obra winnicottiana y sus lazos con la filosofía.
Título: La existencia creativa: una lectura del paradigma winnicottiano en tiempos de adversidad
Resumo: La pregunta sobre la pertinencia de Winnicott al campo del psicoanálisis se responde bajo el uso y la reflexión que realiza en su obra de los conceptos metapsicológicos como inconsciente, síntoma, pulsión (drive), analista, entre otros. Sin embargo, su aporte va más allá del vocabulario freudiano. La noción de transicionalidad y su vínculo con la continuidad de la existencia y la creatividad, lo ubican como un pensador original cuya riqueza tiene una excepcional vigencia en nuestra época actual. La afirmación de “habitar el mundo de manera personal” refiere, entre otras cuestiones, al desafío singular del siendo (being) en términos de autenticidad que no puede ser reducidas a una mera tópica intrapsíquica comandada por la pulsión, sino a la experiencia de “sentirse vivo, verdadero y real” que señala el horizonte abierto de la vida en constante significación.
Profa. Dra. Danit Zeava Falbel Pondé (IBPW/IWA)
Mini currículo: Graduação em psicologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2009), especialista em psicologia Hospitalar (HIAE), Mestre (2012) e Doutora (2017) em Filosofia da Psicanálise pela Unicamp. Professora e Supervisora no Instituto Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana, Membro da IWA. Autora dos livros “O conceito de medo em Winnicott” (2015) e “Cinema no divã” (2015). Atuando principalmente nos seguintes temas: sentimento, afeto, amadurecimento, Psicanálise, Winnicott. Coordenadora do grupo de pesquisa “a crise do amadurecimento na contemporaneidade” LABO/PUC-SP.
Título: O medo de morrer: uma nova perspectiva
Resumo: O tema proposto foi escolhido em sintonia com o que de modo universal se viveu nos últimos tempos com a pandemia. Ainda, de modo particular, pela expressiva presença identificada na prática clínica. O medo de morrer há muito vem sendo naturalizado como um afeto associado a aspectos de segurança e por isso considerado como tema de preocupação focado na busca da verdade psicológica. Pela perspectiva da psicanálise tradicional a dimensão etiológica resulta em ser algo da ordem inata, filha da consciência humana de sua condição irredutível de finitude. Winnicott, por sua vez, propõe uma mudança radical neste olhar indicando a origem ambiental. Ou seja, nos primórdios do bebê, se o alto nível de dependência for insuficientemente cuidado e sustentado que se observará quanto consequência a distorção expressa pela qualidade imobilizante e mobilizante do medo de morrer.
Prof. Eder Soares Santos
Mini currículo: Possui graduação em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas (1997), mestrado em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas (2001), doutorado sanduíche em Filosofia – Universitat Freiburg (Albert- Ludwigs) (2005), doutorado em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas/SP (2006) e pós-doutorado na Bergische Universität Wuppertal (2015). Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Filosofia da Psicanálise, atuando principalmente nos seguintes temas: filosofia da psicanálise, fenomenologia existencial, teoria dos paradigmas em Kuhn, teoria do amadurecimento pessoal. Publicou o livro “Winnicott e Heidegger: aproximações e distanciamentos”. São Paulo: DWW Editorial/FAPESP, 2010 e o livro “Paths of Science of Man in Heidegger”. Nordhausen, Alemanha: Traugott Bautz Verlag, 2019; além de artigos relacionados a essas temáticas. Atualmente é professor permanente do Programa de Pós-graduação em Filosofia e foi coordenador deste mesmo Programa por três gestões. Professor Associado no Departamento de Filosofia na Universidade Estadual de Londrina – Paraná.
Título: Revolução winnicottiana frente a algumas reflexões contemporâneas que corroboram sua mudança de paradigma
Resumo: Esta apresentação explora o aspecto a mudança de paradigmas de Thomas Kuhn que afirma que um novo paradigma tende a ser mais bem aceito – principalmente pelas novas gerações de pesquisadores – quando ele se mostra mais eficiente na resolução de certos problemas que o paradigma anterior não conseguia resolver de forma exemplar. Para tal propósito vamos mostrar como 1) como certas abordagens contemporâneas têm tratado da constituição do indivíduo; 2) que há um pioneirismo em Winnicott em relação ao que hoje encontramos nessas abordagens e 3) que a mudança de paradigma de Winnicott se confirma e se consolida como a melhor forma de pensar a natureza humana até o momento.
Palavras-chaves: Winnicott. Paradigma. Filosofia Contemporânea. Natureza Humana.
Profa. Dra. Caroline Vasconcelos Ribeiro (IBPW/IWA)
Minicurrículo: Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal de São João del-Rei, mestrado em Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba e doutorado e Pós-doutorado em Filosofia pela UNICAMP. É Professora Titular da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) e Colaboradora do Programa de Pós-graduação em Memória, Linguagem e Sociedade (PPGMLS/UESB). Membro da International Winnicott Association (IBPW) e do Instituto Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana (IBPW). Tem experiência na área de Filosofia Contemporânea, Psicanálise, Antropologia Filosófica e Filosofia da Psicanálise. Publicou vários textos sobre o diálogo entre a Psicanálise de Winnicott e a Filosofia de Heidegger. Organizou a obra “Ontologia e Psicanálise: diálogos possíveis” (DWWeditorial, 2018) e com Zeljko Loparic organizou “Winnicott and the future of psychoanalysis” (IWAbooks/DWWEditorial, 2017).
Título: A revolução winnicottiana e as Memórias de Schreber: em busca de um olhar “além” de Freud
Resumo: De que forma o olhar revolucionário da psicanálise de Winnicott poderia lançar luz sobre o livro Memórias de um doente dos nervos, escrito por Daniel Paul Schreber? Em que medida sua leitura se distanciaria da interpretação feita por Freud em seu texto Notas Psicanalíticas Sobre um Relato Autobiográfico de um Caso de Paranoia (Dementia Paranoides), nomeado resumidamente de “Caso Schreber”? A leitura freudiana desta obra ancora-se na hipótese de que a causa ativadora do adoecimento de Schreber refere-se à afloração de uma fantasia feminina de desejo – entendida por ele como homossexual passiva – pela figura do médico Fleschsig. À resistência inconsciente em relação a esta fantasia seguiu-se uma luta defensiva que teria tomado a forma de delírio de perseguição. A maneira como Freud interpreta esse “paciente que é um livro” [1] está ancorada em seu paradigma edipiano e na análise das vicissitudes pulsionais. De todas as manipulações corporais que os milagres divinos, mediante seus raios, efetuavam no corpo de Schreber – a exemplo de retirar-lhe o estômago e o intestino, fazê-lo engolir a laringe, provocar o desaparecimento de um pulmão e forçar-lhe a respirar pouco ar – o aspecto que recebeu apreço analítico de Freud foi a ideia delirante de sua transformação em mulher, ou seja, a sua emasculação a partir de um plano subjacente à “Ordem do Mundo”. Entretanto, encontramos nos 22 capítulos destas Memórias descrições detalhadas de muitos danos à integridade física do paciente e não somente a emasculação. Segundo o relato autobiográfico, Schreber sofria de uma putrefação do baixo ventre que o fazia apodrecer vivo e emanar odores repugnantes, ao deglutir o alimento engolia a própria laringe, estava exposto a uma constante corrosão óssea e seus órgãos internos eram constantemente dilacerados pelos raios. Como ele era imortal, o que era modificado e destruído em seu corpo se restaurava, mas os danos causados pelos milagres divinos lhe perturbavam profundamente. Esse corpo inimigo, perseguidor e putrefato não foi alvo da interpretação freudiana da moléstia de Schreber. Considerando as descrições das memórias do Senatspräsident Schreber almejamos nos perguntar – a partir da revolucionária teoria winnicottiana do amadurecimento – qual o sentido que a hipocondria assume nesse caso? Como a maneira winnicottiana de pensar a paranoia pode lançar luz sobre as Memórias de Schreber? Que sentido assume, neste relato autobiográfico, a perda das fronteiras do corpo? Com isso almejamos ir “mais além” do olhar freudiano, ancorado na teoria do desenvolvimento psicossexual. Em outros termos, almejamos considerar que, apesar de Winnicott não ter se debruçado sobre a obra Memórias de um doente dos nervos, a maneira como sua teoria pensa a psicose, a despersonalização e a paranoia nos fazem ver mais além da hipótese freudiana acerca do adoecimento de Schreber.
Palavras-chave: Freud; Memória; Paradigma; Schreber; Winnicott
INSCRIÇÃO
*Haverá certificado de participação
VALORES
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Estudantes: R$ 190,00
Profissionais: R$ 250,00
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1. O prazo máximo para cancelamento de participação é de até 07 (sete) dias de antecedência do evento.
2. A inscrição no evento somente será cancelada mediante envio de comunicação para o e-mail: admin@ibpw.org.br
3. Serão devolvidos 80% (oitenta por cento) do valor pago, até o último dia útil subsequente ao mês de realização do evento.
4. A inscrição é PESSOAL e INTRANSFERÍVEL.
5. Em caso de não comparecimento no dia do evento o valor investido na inscrição não será reembolsado, não será gerado crédito para outros eventos e não dará direito ao envio de materiais que possam vir a ser entregues no curso.
Inscrições encerradas